Pesquisando sobre o assunto no google, encontrei um interessante diálogo retirado do livro ‘Livre-arbítrio e Determinismo’, de Clifford Willians, em que 3 personagens debatem sobre livre-arbítrio e determinismo. Cada um deles com um ponto de vista diferente – Lázaro é defensor da existência do livre arbítrio (as pessoas têm o poder de escolher sem nenhuma influência), Daniel é defensor do determinismo (tudo o que acontece é pré-determinado) e Carolina é defensora do compatibilismo (é possível existir livre-arbítrio e determinismo).
A conversa se concentra, basicamente, na afirmação ou negação da existência do determinismo. Daniel, o adepto de que tudo é determinado, afirma que o progresso das Ciências trouxe consigo muitas explicações para certos fenômenos. Por exemplo, a Biologia afirma que a constituição genética de um indivíduo é determinada hereditariamente, a Sociologia diz que o comportamento das pessoas está relacionado a fatores culturais, a Psiquiatria explica que os desejos conscientes são frutos de motivos inconscientes, e a Neurologia indica que os nossos pensamentos seriam obras de reações químico-cerebrais. Conclui-se, então que, das palavras do próprio personagem, “Todas [as ciências] juntas dizem-nos que tudo o que fazemos, dizemos, queremos ou pensamos é inteiramente produzido por acontecimentos prévios”.
Um argumento no mínimo curioso que Lázaro, o defensor do livre-arbítrio, utiliza para rebater Daniel é apresentado quando ele expõe as recentes descobertas da Física Quântica. Os físicos, depois de várias experiências, descobriram que fótons e elétrons se movimentavam ao acaso. Não havia uma causa aparente para, por exemplo, que um elétron saltasse de uma órbita a outra. Se tudo é determinado por um fator anterior, o que causava então esse comportamento instável?
Daniel logo o contradiz, afirmando, em outras palavras, que “não conhecer as causas de um acontecimento não significa que esse acontecimento não tenha causas”, o que é verdade. Bem como é verdade que “o fato de se ter achado causas para diversos acontecimentos não signifique que todos os acontecimentos tenham uma causa”, uma das idéias centrais usadas para sustentar o determinismo.
Trazendo a idéia do Determinismo para o campo das relações sociais teríamos um problema. Afinal, quando condenamos uma pessoa por um crime, pressupomos que ela teve escolha de praticá-lo ou não, de outro modo ela não seria responsável pelos atos que cometeu. Ou seja, quando partimos da premissa de culpa e castigo, costumamos pressupor a existência do conceito de responsabilidade moral. Determinismo e responsabilidade moral são, por natureza, incompatíveis.
No entanto, as idéias de condenar e castigar, segundo o defensor do determinismo Daniel, poderiam estar tranqüilamente relacionadas à idéia de determinismo, mesmo que a de responsabilidade moral não. Condenamos e culpamos uma pessoa quando esta realiza um ato indesejável e evitável, para impedir que continue as praticando e para dissuadir que outras pessoas as pratiquem. Faz sentido.
Expus essa macarronada de idéias toda para refletir sobre o texto ‘O Admirável Estatuto do Menor’, de autoria de Danuza Leão, publicado no caderno Cotidiano da Folha de São Paulo de 23 de Julho deste ano. No texto, Danuza expressa toda a sua indignação para com o menor que, amparado pelas leis atuais, não será julgado pelo crime de assassinato e estupro de uma garota e o de assassinato de seu namorado, ambos jovens da classe média. Danuza, quebrando a ‘etiqueta’ de colunista, chega ao ponto de escrever que “tem a esperança de uma hora dessas saber que ele [o menor infrator] foi justiçado por seus companheiro de Febem ou de Manicômio. E com requintes de crueldade”.
Para a colunista, a idéia de que existe o livre-arbítrio é presente. A não ser que defenda a prática de ‘justiçar com requintes de crueldade’ todos os assassinos para que estes não voltem a assassinar bem como para que outros não sejam estimulados a matar, ela dá a entender que o infrator teve plena escolha do que fez e que portanto merece um castigo à altura.
Se as Ciências nos mostraram que "tudo (ou quase tudo, pra quem crê na existência do livre-arbítrio) o que fazemos, dizemos, queremos ou pensamos é inteiramente produzido por acontecimentos prévios", a questão, então, é a seguinte: até que ponto a escolha desse menor por estuprar e assassinar foi influenciada por fatores anteriores e externos à ele? Qual o grau do livre-arbítrio dentro de sua escolha? Muito, pouco? Os fatores que o influenciaram seriam atenuantes?
Pesquisei no site da Folha sobre informações que pudessem me dizer sobre que tipo de pessoa se tratava o criminoso, e o máximo que consegui foi descobrir que nas aulas ministradas da Febem ele só mostrou capacidade de efetuar operações de somas e divisões, mas não multiplicações, aproveitamento equivalente ao de um aluno de 2ª ou 3ª série, segundo o psicólogo que o acompanha. À época do assassinato, o menor tinha 16 anos.
Para o diálogo dos personagens, clique aqui, e para o texto de Danuza Leão, clique aqui (precisa ser assinante da UOL ou da Folha).