Duas concepções sobre a velhice

sábado, 24 de abril de 2010

Duas concepções sobre a velhice

No início dos anos 80, oito jovens se juntaram numa banda chamada "Titãs do Iê Iê Iê", que se propunha a fazer uma releitura do rock'n'roll anos 60, mas de um jeito brasileiro e, obviamente, oitentista.

Com o sucesso inicial e o passar dos anos, novas propostas tomaram corpo. Flertaram com o eletrônico, caíram de cabeça no punk um tanto anarquista, entraram na onda de acústicos e, por fim, na mesmice.

Arnaldo Antunes, o mais brilhante integrante, deixou o grupo no início dos 90. No documentário de Branco Mello e Oscar Rodrigues Alves, "Titãs: a vida até parece uma festa", de 2008, Antunes afirma que a sua saída não se deveu a discordâncias estéticas. Pode ser verdade, mas não há dúvidas de que o poeta queria muito mais do que o que os Titãs estavam oferecendo a sua capacidade artística.

Quem ouve o primeiro disco solo arnaldiano, "Nome" (de 93), tem uma clara amostra do experimentalismo liberto com a carreira solo.

Fiz toda essa introdução para dizer que os membros originais dos Titãs já têm quase 50 anos e uma questão salta aos olhos de cada um deles quando acordam de manhã: estão ficando velhos.

Uma boa maneira de perceber as diferenças de rumo (estético e de conteúdo) que as carreiras de Antunes e dos Titãs tomaram é ouvir o que eles têm a dizer, em letras de música de discos recentes, sobre a velhice.

Em "Quanto Tempo", composta por Tony Bellotto e presente no último disco dos Titãs (Sacos Plásticos), a melodia nada original casa com uma letra igualmente comum. Aquele carcomido sentimento de que o tempo passou e não foi tão aproveitado. Uma música bem feita para o mercado pop em que os Titãs estão inseridos. Mais do mesmo.

"Eu não, não apaguei a luz
Não corri atrás
Não saí quando chegou a hora

Mas a hora chegou
E ninguém me avisou

O tempo passa tão depressa
Logo acaba, mal começa
Eu tenho pressa
Não vou olhar pra trás"

Já em "Envelhecer", Arnaldo usa o gênero Iê Iê Iê (presente em todo o disco, que tem o mesmo nome) para confrontar a velhice. É praticamente um desafio a ela. Em vez de chorar que o tempo passou e ninguém avisou, ele bate no peito e diz "Não quero morrer pois quero ver como será que deve ser envelhecer".

"Pois ser eternamente adolescente nada é mais demodé
Com uns ralos fios de cabelo sobre a testa que não para de crescer
Não sei por que essa gente vira a cara pro presente e esquece de aprender
Que felizmente ou infelizmente sempre o tempo vai correr"

Enquanto os Titãs (que agora têm apenas quatro integrantes) choram o marasmo dos últimos anos e temem a velhice, Arnaldo exalta o experimentalismo que o libertou do rock quadrado e desafia o futuro.
__________________________
Metalinguagem: já faz algum tempo que eu ouvi os dois álbuns, mas apenas recentemente percebi o que tem em comum e fiz a comparação.