Considerações sobre "Mafaro"

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Considerações sobre "Mafaro"

André Abujamra lançou um novo álbum, no último final de semana, denominado "Mafaro" (significa "alegria" no idioma do Zimbábue).

Como fã de Os Mulheres Negras, Karnak e da própria carreira solo de André, publico aqui minhas considerações.

Mistura de ritmos, de instrumentos, de influências e participações especiais ecléticas (Luis Caldas, Zeca Baleiro e Xis). Tudo isso consta no álbum e, mesmo assim, é possível questionarmos qual é a novidade de Mafaro.

Desde o início da carreira, a marca principal de Abu é a mistura. Ele pode ter novas influências (viagem ao Zimbábue, contato com música dos balcãs e conhecimento mais profundo acerca da cultura maranhense), mas as antigas continuam, como o excesso de arranjos com metais, os coros com várias tonalidades vocais (muito comuns no Karnak) nos refrões, partes iniciais e finais das músicas, as rimas propositadamente tolas e bem humoradas, os maniqueísmos das letras (difícil/fácil, verdade/mentira, entre outros).

Quer dizer que o disco é ruim? Não, definitivamente. Pelo contrário.

Mesmo que Abujamra apenas repetisse a fórmula das misturebas, as diferentes variáveis já tornariam o álbum minimamente interessante. Em algumas músicas ele faz o de sempre, mudando alguma coisa. No entanto, não se limita a isso.

A faixa Origem, a primeira do novo trabalho, é essencialmente instrumental e mistura (desculpe a repetição da palavra) arranjos complexos em percussão e metais com riffs simples de guitarra. A letra aparece ao final da música, salpicando apenas as palavras necessárias. Em Logum Edé, o coro de vozes femininas e a delicadeza com que toca a questão da tristeza são de uma sensibilidade pouco comum.

O ponto alto de Mafaro é Duvião, em que o autor relata como enxerga as coisas quando viaja de avião. Muda o ritmo da música três vezes (moda de viola, aboio, baião) ao mesmo tempo em que reflete, de forma bem simples e ingênua, sobre questões como amor e relatividade. Chega a emocionar.
Imaginação, O amor é difícil e a faixa-título também são destaques.

A regiliosidade de Abu se faz presente em diversas canções. Não as considero em termos de conteúdo. Para mim, é como se estivesse ouvindo as recomendações religiosas em Tim Maia Racional. Entra por um ouvido e sai por outro.

Mas o que torna Mafaro diferente é a valorização instrumental de arranjos complexos misturados com melodias simples (algo que não se via desde os tempos de Karnak) e a sensibilidade ingênua de Abujamra. O olhar virgem que relata o óbvio apalpando com o coração.

Ouça o disco clicando aqui.
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Metalinguagem: pensei em falar sobre as letras de Abu politicamente, mas creio que isso não é necessário. Religioso, acredita na bondade do ser humano e em certos castigos divinos. Não compactuo em nada com sua visão, mas o admiro muito musicalmente e, de uma certa forma, poeticamente (existe essa palavra?).