Mercy Zidane: junho 2009

terça-feira, 30 de junho de 2009

A "democrática" FIFA e a Copa da África

(foto tirada do site globoesporte.com, avisando a população, na porta de um estádio sul africano, das possibilidades de sequestro, assaltos e um tipo de crime em que bandidos quebram o vidro de carros)

A milionária entidade máxima do futebol, a FIFA, quis dar uma de democrática e escolheu, há alguns anos, a África do Sul como sede da Copa do Mundo do ano que vem.

A copa ja ocorreu em países subdesenvolvidos, como Brasil, México, Uruguai e Argentina, mas em tempos em que o futebol era mais futebol e menos espetáculo.

Talvez hoje o esporte bretão seja a coisa menos importante de uma Copa do Mundo. E até mesmo por isso, a FIFA aceitou realizar o megaevento no continente africano, como parte de uma jogada política e de marketing.

A recente Copa das Confederações foi um teste que muitos europeus e até brasileiros reprovaram. Afinal, "como um turista irá comemorar as vitórias de sua nação, à noite, após as partidas, se há toque de recolher, trânsito caótico, assaltos, sequestros, assassinatos?"

Alguém precisa lembrar a FIFA de que a África do Sul não pertecence à Europa. Ela e os demais países do continente sofreram anos de exploração realizada por meia dúzia de países que ficam na parte de cima do globo, e não será em poucos anos que os efeitos de um sistema perverso serão revertidos, mesmo que o motivo seja a realização de um dos maiores eventos capitalistas modernos.

A maquiagem midiática e a repressão policial farão com que a copa pareça uma maravilha. Novamente em detrimento do povo local, que deverá assistir à maior parte dos jogos pela televisão, pois o ingresso não será financeiramente acessível.

Bom para os europeus, que poderão curtir o turismo antropológico na "favela do mundo" que eles ajudaram a criar de forma tão cruel. Ah, e o melhor, não serão incomodados pelo "primitivo" barulho das vuvuzelas.
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Metalinguagem: a motivação para eu escrever esse post saiu da matéria linkada no quarto parágrafo.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Rápidas (e rasteiras) generalizações sobre a queda do diploma


Eis meu canudo. Parece, mas não há nenhum diploma dentro.

A discussão sobre a queda da obrigatoriedade de diploma para exercer a função de jornalista, de acordo com a decisão do Superior Tribunal Federal (STF), pode ser vista por alguns viéses, defendidos pelos seguintes grupos generalizados por mim:

-Jornalistinhas diplomados: jornalistas filhos da classe média e que, de maneira corporativa, querem garantir a sua reserva de mercado. Afinal, "estudaram por quatro anos", pagaram mensalidade ou passaram no vestibular. Apesar de só apreenderem/executarem as técnicas jornalísticas na faculdade e, via de regra, pensarem pouco na comunicação em geral, consideram essencial o papel de reprodutores de todo o jornalismo (ruim) que já existe. São contrários à medida do STF.

-Intelectualóides humanistas: estes acreditam que qualquer pessoa, desde que seja formada (não, não pode ser semi-alfabetizada, muito menos pobre) tem condições de exercer a função de jornalista. Do mesmo modo que os diplomados, acreditam que o jornalismo é uma mera técnica. Como tal, basta "aprendida em duas semanas dentro da redação". São favoráveis à medida do STF.

-Democratizadores da comunicação: acreditam que não há sentido em exigir o diploma de um grupo de pessoas que tenta se apropriar de técnicas jornalísticas (exaustivamente repetidas nos meios de comunicação) para expressarem a vontade de um determinado grupo, como ocorre em rádios comunitárias, jornais de bairro e sindicatos. Acreditam na comunicação como uma ferramenta. São favoráveis à medida do STF.

Eu me enquadro mais no último grupo. O único porém é o medo de que o jornalismo acabe sendo considerado, cada vez mais, como um simples conjunto de técnicas; e a comunicação, como uma ciência inferior.

A comunicação não é sinônimo de mídia burguesa. Ela é um processo de transferência de conteúdos e está contida em todos os ambientes. As técnicas existem, mas é preciso entender como elas agem na mente das pessoas, o porquê de o capitalismo ter consagrado determinadas padronizações e se é necessário mudá-las para realizar algo que seja mais emancipador. Enfim, não é num simples parágrafo como este que vou esgotar as possibilidades de estudos (realmente relevantes) em comunicação. Se os atuais estudos são pouco críticos, acredito em possibilidades de mudança.
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Metalinguagem: considerando o post acima em termos de esquerda revolucionária (que desvaloriza o papel da comunicação num processo revolucionário), não há direção que consiga passar seus interesses a operários ou aos próprios militantes sem jornais, panfletos, cartazes, programas de rádio, etc, que realmente expressem o conteúdo da melhor forma, dando possibilidades de diálogo, agregando, falando a língua do público. Isso é essencial e demanda estudo em comunicação.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Três moças do trem

(Acima, as linhas 11 e 12, que passam na região do Alto Tietê. A figura está meio desfocada. Clique na imagem e veja com mais nitidez).

Nesse último feriado, recebi a agradável visita de Andressa Borzilo nesta Suzano apertada entre outras cidades-dormitório, cheias de poluição, ruas estreitas, confusão... e uma linha de trem que as atravessa.

Fomos à capital paulista uma duas vezes (por motivos comerciais e culturais) e tivemos, obviamente, que voltar. O meio utilizado foi o trem.

Não me lembro se em Guaianases ou Ferraz, subiram três moças no vagão em que estávamos. Já era tarde, umas 23h30.

As três deveriam ter entre 14 e 17 anos. O vagão estava um pouco cheio, o que impossibilitou as amigas de se sentarem em locais próximos. A alternativa que encontraram para conversar foi falando alto.

Elas trabalhavam numa loja de roupas, provavelmente em São Paulo, e o bate-papo teve como ponto central o emprego. Falaram mal dele o tempo todo. A remuneração era baixa (não recebiam nem salário mínimo), a jornada era alta e as humilhações, constantes.

As moças contaram vários episódios interessantes. Num deles, relataram, a quem quisesse ouvir, que pegavam algumas peças de roupa enquanto os chefetas estavam desatentos. Também embolsavam uma espécie de comissão por conta própria quando vendiam muito.

Em toda a loja, só tinha uma menina que não fazia "essas coisas". A tal moça começou a trabalhar como babá dos filhos do patrão. Ela contou para as colegas que, uma vez, o patrão a deixou pegar todas as moedas contidas na loja. Umas das interlocutoras comentou:

"Até parece! Nunca um chefe ia dar dinheiro fácil assim para uma empregada".

Elas desceram na estação Calmon Viana. Provavelmente foram pegar a linha 12, que passa na cidade mais pobre da região, Itaquaquecetuba.

Na guerra do trabalho diário, nem todos os explorados sabem de que lado realmente estão. Nesse caso, a consciência das moças e a convicção em exercer atos considerados ilegais e condenáveis por quem tem poder político (caras que roubam muito mais do que simples peças de roupa) surpreendeu-me positivamente.

Mais uma lição tomada no trem.
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Metalinguagem: deixei esse post pronto durante o dia. Após a eliminação do Palmeiras na Libertadores, eu não teria saco para postar.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Truculência policial na USP

Brandão sendo detido por policiais durante manifestação (foto tirada do site da LER-QI)

Mais uma vez a truculência policial foi a solução encontrada por quem comanda a maior universidade do Brasil para conter as manifestações dos servidores (funcionários mais precarizados da USP e de todas as estaduais paulistas), estudantes e professores (todos em greve) que organizavam piquetes e passeatas pela reabertura das negociações no Conselho de Reitores das Universidades Paulistas (Cruesp) reivindicando aumento de salários; retirada da PM da universidade; paralisação nos investimentos na Universidade Virtual do Estado de São Paulo (Univesp, dos cursos à distância); e a readmissão do funcionário demitido por motivos políticos, Claudionor Brandão.

Por força de lei, a Polícia Militar não pode entrar no campus da USP, pois tal instituição tem autonomia garantida. Mas você sabe, quando a coisa começa a apertar, os detentores do poder dão um jeitinho de "legalizar o ilegal". A PM estava de cão de guarda da reitoria há algum tempo. Hoje, ela usou balas de borracha, bombas de efeito moral, gás de pimenta e prendeu três pessoas (segundo informações do G1). Muitos feridos, muita injustiça e, obviamente, inversão de papéis na mídia tradicional (exemplos: programa Brasil Urgente, do Datena, na TV Bandeirantes, e Jornal da Gazeta, da TV Gazeta).

Mas a violência policial foi tão escancarada que alguns orgãos a serviço de grandes empresários não tiveram como não enfocá-la. Veja o trecho de matéria do site G1:

Uma funcionária que tentou dialogar com os policiais sobre a razão dos ataques recebeu gás de pimenta no rosto. "A gente só pediu para conversar, mas eles não querem", disse Solange Francisco, de 45 anos.O estudante de pós-graduação em ciências ambientais Alexandre Souza disse que a fumaça tomou conta do campus. “Eu estava no laboratório de pesquisa do qual faço parte. Quando saí, a Praça do Relógio estava tomada por uma bomba de gás lacrimogênio e gás de pimenta. Como não dava para sair por lá, saí por trás. Para meu espanto, vi que tudo estava tomado pela polícia, que agia com uma postura extremamente violenta”, contou o estudante.

Uma assembléia está sendo organizada neste momento. É possível acompanhar os acontecimentos pelo twitter da greve. Acompanhe também o blog da greve dos trabalhadores da USP.

2007 não acabou. É necessário, mesmo com a influência negativa da grande mídia, mostrar aos trabalhadores e à população em geral, que essas medidas dos grevistas são tomadas em consonância com os interesses da população pobre, por uma universidade pública, gratuita, de qualidade e para todos (e, obviamente, não é no capitalismo que conseguiremos isso).
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Metalinguagem: vejam o último post do Outros Comentários, blog da Andressa, que coloca em contraposição duas fotos, uma de 2007 e outra de 2009.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Rapidinhas

As rapidinhas são inspiradas em várias idéias desconexas que não renderiam um post cada, por isso são aglomeradas em um só:

-Noel e a internet: estava eu zapeando os canais da TV, quando deparo a grande intelectual brasileira, Marymoon, entrevistando o guitarrista da banda inglesa Oasis, Noel Gallagher. Ela perguntava o que ele achava da internet. A resposta foi boa, apesar de reduzir o papel da internet a um repositório de vídeos, como faz o velho Zarcilo Barbosa: "Eu não preciso da internet. Eu não quero ver um vídeo de um gato gordo caindo ou uma aposta de quem come e vomita tudo mais rápido".

-Tirando as músicas dos pobres: aí a Marymoon questionou Noel a respeito dos downloads de discos de bandas. Aí sim, ele realmente foi bem. "Olha, se eu tivesse 14 anos, não tivesse dinheiro e quisesse ouvir um disco de uma banda como o Oasis, claro que eu iria baixá-lo de graça na internet. O problema é que muitos pobres não têm computador para fazer isso. Baixar discos é uma consequência do papel das gravadoras, que gastam R$3 para fazer um álbum e o vendem a R$30".
-Encontro com Milton Santos: assisti ao documentário "Encontro com Milton Santos ou o mundo global visto do lado de cá", de Silvio Tendler, e não gostei muito. No fim das contas, não entendi qual é a proposta dele para uma "outra globalização". Durante o filme, se mostrou um entusiasta da comunicação alternativa e disse defender o Estado. Isso basta? Que tipo de estado "socializante" ele defende e como chegar até ele? Provavelmente o livro de Milton "Por uma outra globalização" deve demonstrar as suas ideias mais concretamente do que o filme.

-Unesp em Suzano: parece palhaçada, mas tem deputado querendo trazer a Unesp para Suzano, em mais um projeto de expansão irresponsável de vagas... Mas é claro que isso não é discutido pela mídia tradicional da região, que fica pagando pau. Enquanto isso, professores e estudantes se juntaram aos funcionários na USP e também entraram em greve... Espero que a mobilização pipoque em todo o Estado, como em 2007.
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Metalinguagem: eu tinha mais assuntos, mas esqueci.