Tem uma porção de gente no mundo. E apesar dos milhares de problemas do viver, que fazem os sorrisos rarearem conforme a idade avança, uma parte desse pessoal todo já deve ter se surpreendido com um prazer repentino surgido numa atividade despretensiosa.
Esse aí da foto é meu pai, contemplando uma das últimas músicas tocadas por Paul McCartney, na apresentação do dia 25, em São Paulo. Descobriu o prazer de "coçar a barriga da guitarra", como diria minha avó, por volta dos 14 anos. Montou bandinhas pelo bairro em que nasceu (e onde mora até hoje) e se apresentou em muitos bares "chapados de gente", como ele gosta de dizer, ao longo dos últimos quarenta e poucos anos. As canções dos Beatles, principalmente da fase mais pop da banda, permearam o início de sua adolescência e marcam presença no repertório de seus grupos até hoje - e claro, também nas suas mais doces lembranças.
Se alguém diz que ele está velho para isso, que tinha de se concentrar no trabalho e em pagar as contas e dívidas ou que essa vida traz o cigarro e a bebida (confesso, como um filho mais chato e responsável que o pai, já fiz algumas dessas críticas), ele responde de bate-pronto: "Eu vou morrer tocando"!
Não sei no que meu velho estava pensando quando minha irmã tirou essa foto. Mas ao olhá-lo nessa posição, após ter se emocionado tanto no show, pensei algo como: a vida é tão difícil. Vendem-nos sonhos e, quando acreditamos neles, são arrancados de nós. Muitas vezes, ele está certo... Só com cachaça pra aguentar tanta coisa que a gente não queria. Só que por mais que essa seja a regra na vida, tem certos prazeres que vão morrer com a gente.
Na saída do show, empolgado e aos 62 anos, ele me perguntou: "Filhão, vamos montar uma banda"?