É a dança da fragmentação

segunda-feira, 26 de julho de 2010

É a dança da fragmentação

O que vou falar agora não é novidade para ninguém. Apenas resolvi ligar os pontinhos:


Quando entrei no curso de Jornalismo da Unesp, em 2005, não entendi de imediato a visão estratégica que os autores do projeto da terceira universidade pública estadual paulista tinham elaborado.

Parecia-me justo espalhar os campi pelo Estado, dando mais oportunidades para jovens do interior participarem de uma universidade pública sem que tivessem a necessidade de se deslocarem a grandes cidades, como São Paulo ou Campinas.

Com o passar do tempo e graças a conversas e leituras, percebi a desarticulação que uma universidade fragmentada provoca. Na questão acadêmica, a integração entre cursos é pequena. Em termos políticos, é bem mais complicada a comunicação, a mobilização das lutas, a organização da agenda de encontros, etc.

E, agora, cursando a minha segunda graduação, percebo mais claramente que isso não ocorre apenas geograficamente. A diferenciação é forçada pelos gestores entre cada uma das categorias universitárias.

Isonomia é o mecanismo que fazia com que os salários de funcionários e professores fossem reajustados na mesma proporção. O reitor João Grandino Rodas, da USP, quebrou tal paridade, aumentou os salários apenas dos professores. O que se cria? Diferenciação entre funcioários. Professor não é funcionário? "É, mas é mais qualificado, tem mais mérito, merece um maior aumento", dizem as vozes oficiais. A greve de funcionários amenizou seus efeitos, mas não os barrou.

Entre os que se consideram funcionários, já há os terceirizados (cerca de quatro mil entre os 15 mil servidores dda USP), predominantemente da parte de limpeza e manutenção. Ganham menos, fazem os trabalhos mais degradantes, não podem ser organizar politicamente senão são mandados embora. E os administradores matam o problema da "imundície" em períodos de greve, tornando uma paralisação longa de servidores mais tolerável à comunidade acadêmica que está se lixando para o fator público da universidade.

Na categoria dos alunos, os que estudam no campus leste da USP são considerados de segunda classe pelo mercado de trabalho. Segundo matérias divulgadas na imprensa recentemente, os cursos "específicos" (novamente a fragmentação) ministrados em tal unidade deixam seus alunos com diplomas inúteis. Será necessário um reingresso nos bancos universitários por mais um ano para complementar a formação e tirar um novo diploma em uma área mais aceita socialmente. A ideia surgiu da própria universidade.

Isso sem contar o Ensino à Distância, ou, se preferir, o ensino Semi-Presencial, como fez questão de afirmar Rodas, no Roda Viva, da TV Cultura. Ele já está sendo implantando via Univesp (Universidade Virtual do Estado de São Paulo) e sua emissora de TV. O estudante sai tão prejudicado por um formação de má qualidade que a própria USP, encarregada de expedir esse tipo de diploma, deixa explícito que não aceitará que seus professores sejam formados por tal modo de ensino. É a propria universidade afirmando diferença qualitativa.

E correm boatos de que professores das faculdades mais lucrativas à universidade querem melhores salários, com novos tetos, corroborando o que os estudantes barraram em 2007, quando Serra emitiu os famigerados decretos que valorizavam o ensino "operacional".

Divide aqui, fragmenta ali, reprime acolá. Alguém tem dúvida do objetivo final?
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Metalinguagem: vou ver se posto mais sobre política e universidade. Assuntos que tomam tempo de minhas reflexões, mas exigem uma argumentação um pouco maior (mesmo que ainda superficial) do que os vômitos sentimentais e futebolísticos que me habituei a postar por aqui ultimamente. A charge é de Latuff, durante a greve da USP de 2009.