Nunca venceram a disputa de quem copiava mais rápido a lição que a professora passava na lousa, na primeira ou na segunda séries.
Lavavam a louça bem devagar, esfregando a sujeira direitinho, na terapia cognitiva que também fazia o pensamento planar pelas memórias de prazeres e dores da vida.
No transporte público, esqueciam de meter os fones no ouvido ou de tirar jornal, livro ou revista da mochila, após passarem pela catraca; ficavam olhando a corrida das árvores desfocadas pela janela, ao lado dos borrões cinzentos com pontinhos coloridos, que buzinavam.
Liam os livros na velocidade em que eles pediam. E eles quase nunca pediam para serem devorados.
Ficavam entre os três últimos candidatos a entregar a prova, em qualquer teste de concurso ou vestibular.
Mastigavam lentamente enquanto os outros engoliam a comida esquecendo-se de notar se havia muito ou pouco sal.
Seguravam ou soltavam o gozo respeitando os sinais do parceiro... Da dança inicial ao abraço suado e intenso, que afrouxava até a sincera conversa começar.
Saboreavam até a tristeza de um coração partido ou de uma desilusão de outra ordem. Inevitável clichê: tudo ia sempre passar.
Por que sempre agiam desse jeito? É difícil saber e certamente eles não estiveram, não estão e não estarão preocupados com isso.
Os "lerdos" (por mais subjetivo e muitas vezes preconceituoso que esse rótulo seja) sofrem de uma disfunção na sociedade da informação: não são afoitos, ansiosos, desesperados... Ou às vezes até são, mas só em alguns poucos momentos, em certas situações.
O "desvio" de personalidade já é suficiente para o bullying que os acompanhou desde cedo. "Você não é tão rápido como a maioria."
Mas quer saber? Com esses surtos de ansiedade, com o turbilhão de informações vomitadas em um deslizar de tela, com os pop-ups de mensagens importantíssimas que imploram por nossa atenção a cada segundo, poder ser lerdo, hoje em dia, é um grande privilégio.