Mercy Zidane: junho 2016

terça-feira, 28 de junho de 2016

Precarization #01 - Modernidade

Wow, a modernidade assusta hein!

Comecei essa série intitulada "Precarization". A ideia é soltar uma charge ou tira mais ou menos no mesmo estilo dessa aí de cima (falando sobre o maravilhoso mundo do trabalho precário) ao menos uma vez por mês. Mas quem sabe eu não bata e dobre a meta?

terça-feira, 21 de junho de 2016

Se chorar não adiantasse nada


E se o caminhão de angústias e tristezas, a montanha de raiva e o morrinho das alegrias não pudessem ser levados para fora?

Imagine-os sempre dentro da gente, deformando nossos fígados, criando rugas profundas em nossas testas e nos cantos de nossas bocas, incomodando nossos estômagos com pontadas regulares.

Os olhos não ficariam úmidos ao vermos a cena brega da novela, lembrando de situações parecidas (ou nem tanto) com as vividas por nós. A saudade não surgiria na música que aquela pessoa especial nos fez conhecer.

As despedidas se resumiriam a apertos de mão. Nos reencontros, abraços apertados seriam proibidos.

Não poderíamos tentar (sem conseguir) expressar fisicamente ou com palavras a falta que alguém fez ou fará.

Depois de tanta dor, não teríamos mais vontade de continuar, de planejar, de pensar que, por mais raiva que dê quando dizem que a vida segue, o clichê costuma ser verdadeiro.

Gozaríamos só com filme pornô. Não poderíamos dançar ou cantar.

Deixaríamos o inconformismo com a injustiça de lado. Ficaríamos mais indiferentes do que já somos.

E chorar, então, não adiantaria nada.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Salmo paulistano

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terça-feira, 7 de junho de 2016

As "cenas lamentáveis" e o elitismo dos comentaristas esportivos


As brigas entre as torcidas de futebol acontecem no Brasil desde meados dos anos 80, quando as organizadas de grandes clubes surgiram. A repercussão veio pelas atrocidades que protagonizaram no começo dos 90, com emboscadas, assassinatos, guerras campais... Principalmente em São Paulo. E de lá pra cá, apesar de algumas coisas terem se alterado, a violência vez ou outra explode perto (ou nem tanto) dos estádios - quando isso acontece, surgem os repetidos discursos de 99% dos comentaristas de futebol da TV brasileira: "bandidos" devem ser presos, organizadas devem acabar.

Algumas punições são aprovadas, mas o torcedor organizado insiste em se levantar como um protagonista de anime japonês após sucessivas surras. Ele vê sua torcida mudar de nome, seus instrumentos de percussão e bandeiras serem proibidos, seus sinalizadores serem apreendidos, mas sempre volta para fazer incríveis espetáculos nas arquibancadas e, invariavelmente, "tretar" com seus rivais. Nessas recorrentes "cenas lamentáveis", o discursinho padrão também se repete preguiçosamente na mídia, separando os "bandidos" das organizadas do cidadão de bem que vai com seus filhos ao estádio.

Começando do começo


Torcidas organizadas não são compostas por santinhos. Há, em muitos casos, tráfico e máfia de revenda de ingressos, para além das habituais brigas com rivais (esse ponto será detalhado mais adiante). Muitas torcidas exalam preconceitos, como homofobia e machismo, já que o futebol ainda é um "reduto do macho" na sociedade. Mas é preciso também levar em conta que nem todas são assim. A forma de organização "torcida organizada" não é, por natureza, composta por tráfico, preconceito e revenda de ingresso. Existem algumas que são politizadas e agem inclusive como movimentos sociais, ao se juntarem a certas causas relevantes - mas é inegável que esse tipo de atuação é exceção.

Sim, grandes organizadas de futebol são, em sua maioria, violentas. E isso acontece no mundo todo, inclusive na "civilizada" Europa. O detalhe que faz toda diferença é que o Brasil é um dos países mais violentos do mundo. Se a violência está em toda a sociedade e o futebol é parte importante da cultura brasileira, como ele poderia ficar de fora?

Num país em que futebol (assistir e jogar) é uma das poucas formas de lazer baratas, indivíduos sem muitos recursos se veem encantados pela magia do esporte bretão; as reviravoltas, os heróis, a festa da torcida dão o prazer difícil de ser encontrado em outras esferas da vida. Assim, eles fazem dos jogos semanais a grande válvula de escape de suas vidas e se associam a outras pessoas em situação parecida; organizam os espetáculos das torcidas; veem seus esforços beneficiarem o time (em termos motivacionais, entoando cantos e fazendo pirotecnia) e se sentem importantes. Sem contar que, em algumas situações, arranjam maneiras de viver a partir da organizada (revenda de ingressos, tráfico). Como o futebol, apesar de ser resolvido na disputa de bolas que ultrapassam a linha do gol, é um conflito entre equipes, os que levam o time como grande razão de viver acabam liberando a violência represada em cima dos "inimigos" torcedores de times rivais. Com isso, ganham respeito, poder e, às vezes, algum dinheiro. Benefícios importantes para quem nasceu e viveu numa condição social desfavorável.

Tudo que eu disse acima é um achismo longe de ser comprovado cientificamente, e que foi extraído das minhas experiências como frequentador de arquibancada e interessado no tema.

Como lidar?


Não se resolve o problema da violência construindo mais prisões. E não se resolve o problema das organizadas prendendo todos seus membros, pelo menos não no Brasil. Aqui, o buraco é mais embaixo. Se todos forem presos, novos organizados vão surgir e os antigos vão dar um jeito de voltarem, justamente pela conjunção de questões anteriormente citadas. Na Europa, há casos de modelos punitivos que deram certo, banindo alguns indivíduos de estádios, por exemplo. Mas a situação deles é bem diferente da brasileira. Não há saída fácil. Certamente que algumas medidas podem ser tomadas para evitar brigas generalizadas, como policiamento reforçado, redução da carga de ingressos da torcida visitante, banimento de brigões recorrentes, mas é preciso reforçar que elas são apenas ações paliativas, já que a violência no Brasil está bem longe do fim.

Surge então o oportunismo dos comentaristas reaças que dominam a programação das mesas redondas dos canais de TV brasileiros, generalizando todo torcedor que sai de seu assento no estádio como selvagem, fazendo vista grossa para a importância da organizada para o espetáculo e pregando abertamente o modelo mais efetivo e ordeiro para banir não só os brigões do estádio, mas todos que não têm dinheiro: a elitização.

Ela veio com as novas arenas e os preços exorbitantes de seus ingressos, e com a medida recente da torcida única, adotada nos clássicos paulistas e que mata um tanto enorme da alma de uma rivalidade... E muito da graça do futebol. Para não correr riscos no ambiente em que está tornando seu, a elite pretende transformar os estádios em ambientes assépticos, insossos e brancos.

Defensores do jeito confortável e americanizado de torcer, os comentaristas reaças defendem cadeia para todos os organizados sem perceber que não é tapando os olhos para a violência que se chega a algum lugar; querem torcidas sentadas nas poltronas e consumidoras na região em que mais se torce com a paixão em todo o mundo; querem banir os brigões dos estádios levando todos os pobres junto.